quinta-feira, dezembro 07, 2006

O sol se esconde atrás das nuvens da memória

Houve um tempo em que tudo era muito diferente: não havia saudade e nem recordações doídas. Havia somente o céu azul e o sol brilhando atrás de um muro. E havia também uma menina, com seus seis anos de idade, que ia para a janela esperar o padeiro, que todos os dias subia a rua em uma bicicleta, trazendo um cesto cheio de pães de todo o tipo.

Havia também aquela avó, sorridente e cheirando a talco, que trazia a música. Ela chegava sempre de sandália de salto, cabelo arrumado, olhos brilhantes. E eram verdes! Para a menina, aquilo era o que havia de mais bonito. Sem contar o céu cheio de nuvens e aqueles dias quentes como um aconchego.

E naquele tempo, havia a escola, a menina loira e de olhos azuis. E houve o abuso, a denúncia, o castigo. E houve o reencontro, alguns anos depois, com o abusador.

Ela nunca parou para pensar se ele repetiria aquilo algum dia. E nunca soube o que acontecera com a menina ou com o garoto. Mas lembra da indignação que sentiu ao saber do abuso e da satisfação que sentiu ao contar para a professora.

Ao mesmo tempo, havia um sentimento de inferioridade, de melancolia pela vida. Sentia-se excluída dos acontecimentos. Achava-se feia, desinteressante. Queria parecer mais, queria ser legal aos olhos dos outros, mas sentia que estava sempre se afundando mais e mais, sentia que estava indo pro caminho errado. Certas músicas davam a ela a sensação de que estava no lugar errado, na hora errada, com a idade errada. Ela queria alcançar o céu, mas não sabia como.

Um comentário:

Ruby Tuesday disse...

Ai... que bonito...